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Análise da Responsabilidade Objetiva dos Bancos em Caso de Fraude Praticada por Terceiro

Escrito por Juliana Piamolini, advogada, especialista em Direito Empresarial e bacharelanda em Ciências Econômicas.

Resumo: Por meio de pesquisa bibliográfica, busca-se analisar a forma como os bancos são responsabilizados em casos envolvendo fraude bancária, mesmo quando aplicada por terceiro, não vinculado à instituição bancária. Buscou-se analisar os diferentes entendimentos dos tribunais nacionais, em julgamento de casos parecidos. Fez-se uma análise sobre os mais diversos tipos de fraudes que estão sendo praticadas atualmente, como forma de entender os critérios para julgamento de demandas envolvendo esse tipo de litígio. 

Palavras-chave: Direito Bancário; Fraude Bancária; Direito do Consumidor; Responsabilidade Objetiva.

Abstract: Through bibliographical research, we seek to analyze the way in which banks are held responsible in cases involving bank fraud, even when carried out by a third party, not linked to the banking institution. We sought to analyze the different understandings of national courts when judging similar cases. An analysis was made of the most diverse types of fraud that are currently being practiced, as a way of understanding the criteria for judging demands involving this type of litigation.

Keywords: Banking Law; Bank Fraud; Consumer Law; Objective Liability.

 

Introdução

 

A fraude bancária é um problema crescente, que afeta clientes em todo o mundo. Com o avanço da tecnologia e a virtualização dos serviços prestados pelos bancos, os criminosos encontram cada vez mais maneiras sofisticada e criativas para cometer fraudes, representando um deságio significativo para os sistemas de segurança dos bancos.

Entretanto, por mais que os bancos se dediquem à proteção de seus clientes, há algumas manobras que tornam o serviço prestados por eles defeituosos, como a falta de cuidado no tratamento de dados de seus clientes. Surge, daí, o dever de indenizar àquelas vítimas desse vazamento de dados.

Este artigo explora os fundamentos jurídicos da responsabilidade objetiva dos bancos em casos de fraude, os critérios os desafios enfrentados por todas as partes envolvidas: bancos, clientes, criminosos e judiciário.

Ao compreender melhor essa questão, podemos promover uma discussão construtiva sobre os direitos e deveres das partes envolvidas.

 

Análise da Responsabilidade Objetiva dos Bancos em Caso de Fraude Praticada por Terceiro

 

A responsabilidade objetiva dos bancos é uma teoria jurídica que estabelece que, independentemente de culpa, os bancos são responsáveis por indenizar os clientes por perdas decorrentes de fraudes em suas operações. Esse instituto foi sumulado pelo STJ e estabeleceu o que segue:

Súmula 479/STJ. As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.

 

Da mesma forma, nos termos do artigo 14, parágrafo 1º do Código de Defesa do Consumidor, o serviço é considerado defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor precisa. A prestação do serviço de qualidade pelos fornecedores abrange o dever de segurança, que engloba a integridade patrimonial. Por fim, considerando que o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras (Súmula 297/STJ), estes devem disponibilizar serviços de qualidade no mercado de consumo, tutelando pela segurança de seus clientes, acima de qualquer coisa.

Nesse cenário, as instituições bancárias respondem, de forma objetiva, pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros, como, por exemplo, abertura de conta corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude, isso porque tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno (REsp n. 1.197.929/PR, Segunda Seção, julgado em 24/8/2011, DJe 12/9/2011).

Embora, como visto, a jurisprudência entenda, quase que de forma unânime, que os bancos respondem de forma objetiva aos fortuitos internos, existem alguns critérios para aplicação da responsabilidade objetiva. Quais sejam, a prova do dano e do nexo de causalidade, a boa-fé do cliente e a forma de atuação do banco.

Em outras palavras, o cliente deve comprovar o dano sofrido; deve comprovar que agiu de boa-fé e tomou as precauções necessárias para evitar a fraude, como proteger suas senhas; e deve haver a demonstração que o banco não adotou as medidas necessárias para proteger suas operações. Preenchido esses requisitos, nasce o dever de indenizar/responsabilizar. 

De todo modo, para sustentar o nexo causal entre a atuação do estelionatário o vazamento de dados pessoais pela instituição bancária, é imprescindível investigar quais dados estavam em poder dos criminosos e quais foram disponibilizados pelo banco de dados da instituição financeira. Isso tudo com o fim de examinar a origem do vazamento e, consequentemente, identificar a responsabilidade dos agentes respectivos.

Assim, para se imputar a responsabilidade às instituições financeiras, deve-se garantir que a origem do indevido tratamento seja o sistema bancário. Isso porque, os dados sobre operações financeiras são, em regra, de tratamento exclusivo das instituições financeiras.

Portanto, dados pessoais vinculados a operações e serviços bancários são sigilosos e cujo tratamento com segurança é dever das instituições financeiras. Desse modo, seu armazenamento de maneira inadequada, a possibilitar que terceiros tenham conhecimento dessas informações e causem prejuízos ao consumidor, configura falha na prestação do serviço (artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor e 43 da Lei Geral de Proteção de Dados).

Apesar dos fundamentos jurídicos e critérios estabelecidos, a aplicação da responsabilidade objetiva dos bancos em casos de fraude ainda gera controvérsias e desafios. Um deles é o diferente entendimento jurisprudencial nacional. No Estado do Rio Grande do Sul, por exemplo, o Tribunal entende que quando há ausência de adoção de procedimento para evitar o dano ao cliente, há conivência do Banco na fraude, e, portanto, ação contrária à boa-fé objetiva.  Surgindo o dever de indenizar:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZATÓRIA. FRAUDE NA CONTRATAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. COMPROVAÇÃO PELA PERÍCIA GRAFODOCUMENTOSCÓPICA. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. CABIMENTO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. REFORMA DA SENTENÇA. 1. Resta incontroverso que a perícia grafodocumentoscópica realizada nos autos confirmou a tese da inicial, no sentido de que o contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC) questionado na inicial não foi celebrado pela autora, tratando-se de fraude. 2. Com relação à repetição do indébito em dobro, aplicável ao caso o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, firmado no julgamento dos embargos de divergência em Agravo em Recurso Especial nº 676.608 – RS, que estabeleceu a tese de que “a restituição em dobro do indébito independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, revelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva”, com a modulação de efeitos para a aplicação do entendimento após a data da publicação (31/03/2021). 3. Ainda que, no caso, os descontos tenham iniciado em 2020, houve ausência de adoção de procedimentos para evitar o dano, o que revela que o banco-réu assumiu o risco de causar o dano ao consumidor através de contratação inexistente, revelando a conivência e, desta feita, agir contrário à boa-fé objetiva. Via de consequência, considerando-se que a sentença determinou a restituição na forma simples, resta cabível a reforma da sentença no ponto. 4. A falha na celebração do contrato impôs angústia e preocupação à autora, decorrente da realização de descontos em seu benefício previdenciário, de natureza salarial/alimentar. Tais fatos, associados à própria violação de dados ocorrida, ultrapassam o mero dissabor cotidiano, sendo passíveis de impor o dever de reparação moral. 5. Valor da indenização fixado em R$ 8.000,00, conforme parâmetro adotado por este Colegiado em casos assemelhados, acrescidos dos consectários legais determinados na fundamentação. 6. Ônus sucumbenciais redimensionados. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA, DE PLANO.(Apelação Cível, Nº 50065422620208210021, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em: 07-03-2024)

 

Já no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, há decisões que avaliam de forma mais cautelosa sobre as providências que os bancos adotaram para evitar determinada fraude:

 

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – Aquisição de veículo através de leilão – Ocorrência de fraude – Pretensão de responsabilizar a instituição financeira por suposta omissão em obstar a abertura de conta corrente do estelionatário, permitindo a consecução da fraude – Descabimento – Culpa exclusiva da requerente que adquiriu veículo através de contato por Facebook e troca de mensagens por whatsapp, transferindo, sem a cautela necessária, o valor da venda fraudada para conta bancária informada pelo estelionatário, sem sequer conferir se o veículo ou a sede física da empresa de leilões existia – Ausente falha na prestação dos serviços bancários – Responsabilidade objetiva da instituição financeira elidida (art. 14, §3º, do CDC) – Culpa exclusiva da autora, e dolo de terceiro, que não guardam qualquer nexo causal com a atividade desenvolvida pela instituição financeira – Transferência bancária do valor do veículo vendido por leilão falso efetuada espontaneamente pela autora para conta corrente informada pelo estelionatário – Nexo causal inexistente – Banco réu que não participou do negócio fraudado entre a requerente e fraudador – Fortuito externo, a excluir o dever de indenizar do Banco – Precedentes desta Corte – Recurso do banco provido para julgar improcedente a demanda, prejudicado o apelo da autora, bem como condenada a requerente ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios de 10% do valor da causa, observada a gratuidade judiciária e os demais termos da r. sentença.  (TJSP;  Apelação Cível 1000491-62.2023.8.26.0073; Relator (a): Mendes Pereira; Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Privado; Foro de Avaré – 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 19/03/2024; Data de Registro: 19/03/2024)

 

De outra banda, o Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina possui entendimentos que consideram o cuidado do consumidor, ao não adotar medidas cautelares necessárias antes de realizar qualquer pagamento fraudulento, por exemplo:

 

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA E INDENIZATÓRIA. RESPONSABILIDADE CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. IMPROCEDÊNCIA À ORIGEM. RECURSO DA PARTE AUTORA. CONTRATO DE FINANCIAMENTO. FRAUDE NA EMISSÃO DE BOLETO PARA QUITAÇÃO DE CONTRATO. TÍTULO NÃO SOLICITADO NO SÍTIO ELETRÔNICO DO BANCO REQUERIDO. INDICAÇÃO DE BENEFICIÁRIO DISTINTO NO DOCUMENTO QUITADO PELO AUTOR. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA QUE NÃO DESONERA O CONSUMIDOR DE DEMONSTRAR, AINDA QUE MINIMAMENTE, A PROVA DO FATO NO QUAL SE FUNDAMENTA O SEU PEDIDO. SÚMULA N. 55 DO ÓRGÃO ESPECIAL DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DOCUMENTO PAGO EMITIDO POR MEIO DIVERSO DOS CANAIS DE ATENDIMENTO OFICIAIS. CONSUMIDOR QUE NÃO ADOTOU AS CAUTELAS NECESSÁRIAS ANTES DE EFETUAR O PAGAMENTO. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE CONFIGURADA (ART. 14, §3º, CDC). INVIABILIDADE DE RECONHECIMENTO DA QUITAÇÃO DO DÉBITO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5004325-24.2023.8.24.0020, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Ricardo Fontes, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 12-03-2024).

 

Em suma, a responsabilidade objetiva dos bancos, em casos de fraude, é um princípio jurídico fundamental, que tem por objetivo a proteção dos interesses dos clientes. Contudo, a responsabilização dos bancos de forma indiscriminada não tem ocorrido, a nível nacional, uma vez que diversos juízes e desembargadores têm se atentado aos fundamentos de fato dos litígios.

Uma vez que a sanção aos bancos pode gerar controvérsias, é essencial que os bancos e clientes trabalhem juntos para prevenir e combater as fraudes bancárias, garantindo, assim, um ambiente seguro e confiável para todas as partes.

 

Considerações Finais

 

Em conclusão, a fraude bancária representa um desafio significativo para o sistema financeiro global, afetando tanto instituições bancárias, quanto clientes. A responsabilidade objetiva dos bancos em casos de fraude é um princípio jurídico fundamental, que visa proteger os interesses dos clientes e garantir a integridade do sistema financeiro. Embora os tribunais nacionais ainda possuam entendimentos diversos, a sanção judicial é essencial para promover a confiança e a transparência nas relações bancárias.

Para combate, é crucial que os bancos invistam em sistemas de segurança, eduquem os clientes sobre os riscos e implementem medidas preventivas adequadas. Da mesma forma, os clientes devem estar vigilantes e tomar precauções para proteger suas informações financeiras.

A conscientização sobre os riscos inerentes à atividade bancária e a adoção de medidas preventivas são essenciais para proteger o sistema financeiro e garantir transações seguras e confiáveis no futuro.

 

Referências

GIORDANI, José Acir Lessa. A responsabilidade civil objetiva genérica no Código Civil de 2002. Rio de Janeiro: lumen juris, 2004;

MARQUES, Cláudia Lima. Direitos básicos do consumidor na sociedade pós-moderna de serviços: o aparecimento de um sujeito novo e a realização de seus direitos. Revista de Direito do Consumidor, nº 35, julho-setembro de 2000;

STJ. Súmula 479. As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias. Brasília, 2012;

BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 12 set. 1990.

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